Argumentos
A tese do autor do recurso, representado pela Defensoria
Pública, era de que a aplicação da reincidência caracterizaria bis in idem, ou
seja, o réu seria punido duas vezes pelo mesmo fato. Durante a sustentação oral
no Plenário, o defensor público federal Afonso Carlos Roberto do Prado comparou
a situação com a de pessoas que cometem infração de trânsito e nem por isso são
punidas como reincidentes.
“O agravamento pela reincidência traz a clara situação de
penalizar outra vez o mesmo delito, a mesma situação com a projeção de uma pena
já cumprida sobre a outra”, afirmou. De acordo com o defensor, a regra também
contraria o princípio constitucional da individualização da pena, estigmatiza e
cria obstáculos para o réu a uma série de benefícios legais.
Já a representante do Ministério Público Federal (MPF),
Deborah Duprat, defendeu a constitucionalidade da regra e afirmou que o sistema
penal brasileiro adota a pena com dupla função: reprovação e prevenção do
crime. Portanto, segundo afirmou, a “reincidência foi pensada no sentido de
censura mais grave àquele que, tendo respondido por um crime anterior, persiste
na atividade criminosa”. Para ela, não se pune duas vezes o mesmo fato, se pune
fatos diferentes levando em consideração uma circunstância que o autor do fato
carrega e a história de vida do agente criminoso.
Voto
O relator do caso, ministro Marco Aurélio, negou provimento
ao recurso ao afirmar que, ao contrário do que alega a Defensoria Pública, “o
instituto constitucional da individualização da pena respalda a consideração da
reincidência, evitando a colocação de situações desiguais na mesma vala”.
Conforme asseverou o ministro, o instituto da reincidência está em harmonia com
a lei básica da República – a Constituição Federal – e “a regência da matéria
circunscreve-se com a oportuna, sadia e razoável política criminal, além de
envolver mais de 20 institutos penais”.
Nesse sentido, ele destacou que as repercussões legais da
reincidência são diversas e não se restringem à questão do agravamento da pena.
Por essa razão, caso a regra fosse considerada inconstitucional, haveria o
afastamento de diversas outras implicações que usam a reincidência como
critério, a exemplo do regime semiaberto, da possibilidade de substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou por multa, do
livramento condicional, da suspensão condicional do processo, dentre outros.
“Descabe dizer que há regência a contrariar a
individualização da pena. Ao reverso, leva-se em conta, justamente, o perfil do
condenado, o fato de haver claudicado novamente, distinguindo-o daqueles que
cometem a primeira infração penal”, afirmou o ministro.
Seu voto foi acompanhado por todos os demais ministros que
participaram do julgamento – Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia,
Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e o presidente, Joaquim Barbosa.
A ministra Cármen Lúcia ponderou que a regra é uma forma de
se tratar igualmente os iguais, deixando a desigualdade para os desiguais e
garante àquele que cometeu um delito “a oportunidade de pensar sobre isso para
que não venha a delinquir novamente em afronta à sociedade”.
O presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, destacou
que a pena tem finalidade ressocializadora e preventiva, de modo que o
condenado que volta a cometer novo crime demonstra que a pena não cumpriu
nenhuma dessas finalidades.
Repercussão geral
Apesar desse processo ter chegado à Corte anteriormente à
regulamentação da repercussão geral, os ministros decidiram aplicar à decisão
de hoje os efeitos desse instituto, uma vez que a matéria teve repercussão
geral reconhecida em outro recurso (RE 732290, de relatoria do ministro Gilmar
Mendes). Dessa forma, o mesmo entendimento será aplicado a todos os processos
semelhantes em trâmite nos demais tribunais do País.
Além disso, o Plenário decidiu que os ministros poderão
aplicar esse entendimento monocraticamente em habeas corpus que tratem do mesmo
tema.
Habeas Corpus
Em seguida, os ministros também negaram quatro Habeas Corpus
(HCs 93411, 93851, 94361 e 94711) que tratavam da mesma matéria. O relator dos
HCs, ministro Gilmar Mendes, votou no sentido de negar todos os pedidos e fez
uma distinção apenas em relação ao HC 93411, que discutia uma multa aplicada ao
réu. “Diante da jurisprudência segundo a qual não se permite a conversão da
multa em pena privativa de liberdade, nesse ponto não estou conhecendo do
habeas corpus”.
Fonte: Site do STF
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