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domingo, outubro 31

Roubo de cargas: um ataque a cada seis horas no RS

A ação de quadrilhas especializadas em roubar carregamentos produziu nos primeiros 10 meses do ano um prejuízo de R$ 85 milhões, conta que acaba sendo paga pelo consumidorOs ladrões de cargas causam em média R$ 8,5 milhões de prejuízo mensal ao setor de transportes no Estado.

Ao longo do primeiro semestre deste ano, foi registrado um ataque a cada seis horas no Rio Grande do Sul, segundo dados da Secretaria da Segurança Pública.

Versões modernas dos piratas que no passado singravam os mares para pilhar, os bucaneiros do asfalto usam armas automáticas e veículos possantes. Quase sempre escondem o rosto sob capuzes e toucas. Agem sob encomenda. As investigações policiais apontam que os bandidos estão em geral informados da carga levada pelo veículo abordado.

De janeiro a junho deste ano, foram registrados 719 casos, entre furtos (sem a presença do motorista) e roubos (com violência ou ameaça) de carga em caminhões e veículos de entrega. O número representa 5% a mais do que em 2009.

Apesar da redução de 14,2% nos ataques violentos nas estradas contra caminhoneiros, os indicadores foram impulsionados pelo aumento das investidas contra pequenos utilitários usados para distribuição dentro das cidades e contra veículos parados em postos de combustíveis, onde as cargas são levadas sorrateiramente.

Os roubos de carga se concentram na Capital e nos municípios vizinhos. Cerca de 60% dos casos são registrados na região – os demais estão pulverizados pelo Estado. Além de ser ponto de partida e destino de boa parte das cargas e de concentrar grande volume de veículos pesados, a Região Metropolitana também figura como área onde as quadrilhas distribuem no varejo e na indústria os produtos e as matérias-primas roubados – às vezes, por meio de empresas devidamente constituídas.

– Os produtos acabam tanto em minimercados quanto em grandes lojas. É um esquema organizado – afirma José Carlos Silvano, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado do Rio Grande do Sul (Setcergs).

Natal preocupa transportadores

Cidades com entrepostos alfandegários, como Livramento e Uruguaiana, e polos produtores, como a Serra, que fornece vinhos e espumantes, também são visadas pelas quadrilhas. Os ladrões aproveitam a distração dos caminhoneiros, que param para comer ou dormir em hotéis de beira de estrada.

A exemplo do que ocorre na região Sudeste do país, que concentra 81,4% dos casos, os caminhões carregados com alimentos, produtos de informática, remédios e cigarros são os alvos mais frequentes.

Com a aproximação das festas de final de ano, aumenta a preocupação das empresas com o transporte de outros produtos, como brinquedos e bebidas alcoólicas.

– Pode ter certeza que duas ou três cargas de espumantes vão ser roubadas antes da virada do ano. E de cerveja também – diz um empresário do setor de transportes, sediado em Cachoeirinha.

Estimativas das entidades indicam que o prejuízo com ataques no Estado já alcançou os R$ 85 milhões nos 10 primeiros meses de 2010. No ano passado, chegou a R$ 102 milhões – 11,4% das perdas no Brasil, que foram R$ 900 milhões, segundo a Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística


O CONSUMIDOR

Os prejuízos causados pelas perdas de caminhões e de cargas e pelo aumento no custo dos seguros acabam pesando no bolso do consumidor.
Os prejuízos causados pelas perdas de caminhões e de cargas e pelo aumento no custo dos seguros acabam pesando no bolso do consumidor.

– Infelizmente, a ponta final da cadeia produtiva é que paga parte dessa conta – diz José Carlos Silvano, do Setcergs.

Essa conta é paga quando o consumidor adquire um produto. O valor que ele desembolsa no caixa remunera não só os custos de produção, frete e comercialização.

Nele está embutido também o pesado investimento das transportadoras em segurança. Boa parte dos orçamento delas hoje é direcionado para a área.

Conforme José Bento Di Napoli, vice-presidente de operações do Grupo Apisul, que atua na gestão de riscos para empresas transportadoras, a prevenção de roubos atualmente combina monitoramento eletrônico, seguro, escolha de rotas, cadastro de motoristas e escolta armada. Dependendo da carga, isso pode representar até 12% do valor de um frete.

Entre as despesas que os consumidores estão bancando está a da montagem de centrais de monitoramento. Só a instalação de rastreadores pode custar até R$ 7 mil.

Geralmente, além de um equipamento capaz de cortar o fluxo de combustível, outro chip é instalado para mostrar a localização do veículos caso o primeiro dispositivo seja violado. Os custos de manutenção do serviço por veículo chegam aos R$ 500 mensais.

– Cerca de 5% do meu faturamento é gasto em gerenciamento de risco. Mesmo assim, um caminhão virou pó em agosto – conta o empresário do setor Valmor Scapini.

O TRANSPORTADOR

O empresário do transporte de cargas Valmor Scapini já perdeu 15 caminhões para o crime. Ele alerta que o setor está se debilitando ao assumir os custos da insegurança nas estradas.

Os reflexos, diz, são o envelhecimento da frota e falta de manutenção de veículos das transportadoras sufocadas. É uma rotina de medo.

– Cada vez que o telefone toca de forma inesperada você pensa: outro assalto? – conta ele.

As transportadores fazem o possível para driblar as quadrilhas. Além do investimento em dispositivos eletrônicos, misturam as cargas transportadas para dificultar a vida dos ladrões, que terão de encontrar diferentes receptadores para as mercadorias.

A estratégia é incentivada pelas seguradoras, como forma de minimizar os prejuízos com um eventual ataque. Elas também impõem limites ao valor a ser transportado por cada veículo. Dependendo da encomenda, mesmo que exista espaço no caminhão, a carga tem de ser fracionada. Essa tática encarece o serviço.

Restrita a alguns produtos mais cobiçados, a escolta armada é outra alternativa, mais agressiva. O transporte de cigarros do Rio Grande do Sul para outros Estados, por exemplo, é feito em comboio de 10, 12 caminhões, com apoio de seguranças que patrulham em veículos discretos a rota usada para levar os maços do Vale do Rio Pardo até os centros de distribuição no Sudeste.

AS QUADRILHAS

O envolvimento de pessoas ligadas ao transporte da carga está por trás da maior parte dos ataques. As quadrilhas cooptam cúmplices entre funcionários de embarcadores, de transportadores e até das empresas que receberiam a encomenda.

Segundo a polícia, a participação vai desde o fornecimento de informações sobre o tipo de carga e a rota usada até a entrega do caminhão em uma falsa emboscada.

A maioria dos assaltos ocorre em estradas que ligam a Região Metropolitana ao restante do Estado. O ataque, geralmente, é feito em dois ou três veículos, que cercam o caminhão: um dos bandidos armado projeta o corpo para fora do carro e anuncia o assalto.
Para driblar a vigilância eletrônica, algumas quadrilhas utilizam bloqueadores móveis de sinal de celular. Os equipamentos tornam o caminhão invisível às centrais.

– Em alguns casos, a quadrilha conta com ajuda do motorista, que recebe dinheiro para entregar o caminhão– diz o delegado Guilherme Wondracek, da Delegacia de Repressão ao Roubo de Carga do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).

A aproximação com os caminhoneiros ocorre em postos de combustíveis ou ao redor de entrepostos alfandegários. Os valores variam de R$ 2 mil a R$ 5 mil. Após a carga ter sido levada, o caminhoneiro registra o crime, sem descrever veículos e criminosos.

Outra estratégia, mais violenta, é render os motoristas durante uma parada. Abordados ao descer ou se aproximar do veículo, os caminhoneiros são feito reféns. Só são libertados depois de a carga ter sido subtraída.

A POLÍCIA

Entre janeiro e outubro deste ano, mais de 60 criminosos envolvidos em assaltos e receptação de produtos foram presos pela Delegacia de Repressão ao Roubo de Carga do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).

Apesar disso, o crime não arrefeceu. Em parte porque muitos dos suspeitos presos já estão de novo nas ruas, após terem suas prisões relaxadas pela Justiça.

– Neste ano, houve um criminoso que já foi preso duas vezes. Agora está solto, e desconfiamos que voltou a agir – afirma o delegado Guilherme Wondracek.

A receptação é vista como um impulsionador dos assaltos. A fiscalização rigorosa dos estoques de empresas poderia reduzir a ação das quadrilhas. O Setcergs defende um trabalho conjunto de técnicos do Fisco e policiais.

– Já tivemos reuniões na Secretaria da Fazenda, mas nada avançou – acredita José Carlos Silvano, do Setcergs.

O delegado Wondracek confirma que já houve negociações para que operações em conjunto virassem rotina, mas o trabalho, na prática, ainda não é integrado. O policial concorda que a presença dos fiscais seria importante para a detecção de fraudes em notas e balanços, que indicariam a compra de produtos roubados.

A assessoria de imprensa da Secretaria Estadual da Fazenda informa que as equipes de fiscalização concentram seus esforços no combate à sonegação fiscal em blitze em estradas e também em visitas a estabelecimentos comerciais.
(Fonte: Zero Hora)

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