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domingo, outubro 18

O “novo” tipo penal de Estupro: tipo misto de conteúdo alternativo ou tipo misto de conteúdo cumulativo ?



A Lei 12015, publicada em 10 de agosto do ano em curso, promoveu diversas alterações no Título VI do Código Penal Brasileiro, ao versar sobre os crimes, agora, contra a Dignidade Sexual. De destacar, dentre as modificações, a unificação dos antigos crimes de Estupro e Atentado Violento ao Pudor - artigos 213 e 214 - num único tipo, qual seja, o novo Art. 213, cujo 'nomem juris ' permanece como Estupro, consubstanciado em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. De ver-se, assim, excluída a expressão "mulher", indicativa da necessidade de ser pessoa do sexo feminino a vítima deste crime, ao tempo em que incluída a expressão alguém, que permite se constituam vítimas quaisquer pessoas, inclusive os homens. O próprio ato libidinoso, que antes estava limitado à conjunção carnal, agora, no novo tipo, abriga toda a espécie de atos de libidinagem.

O novo tipo ampliado do estupro se transformou, de tipo simples em tipo penal misto, com pluralidade de ações incriminadas, de conteúdo variado, portanto. Assim, caberia indagar se o novo tipo de conteúdo variado, se trataria de espécie penal de conteúdo alternativo ou de conteúdo cumulativo.

Os tipos penais de conteúdo alternativo – como são o Tráfico de drogas e a Participação em Suicídio, por exemplo – se caracterizam pela fungibilidade das condutas, sendo totalmente indiferente a realização de uma ou de mais delas para a caracterização do crime, que é único.  Assim, se no crime de participação em suicídio o agente induz, apenas, ou induz e auxilia, a unidade delitiva permanece inalterada, o mesmo sucedendo no tráfico de drogas, se o autor importar e manter em depósito, ou simplesmente depositar, o crime é único.

Os tipos penais de conteúdo cumulativo, contudo, se diferenciam porque neles  não há fungibilidade  entre as ações delitivas, autorizando-se, portanto, o reconhecimento da multiplicidade de crimes e, assim, permitindo a cumulação das penas ou o reconhecimento da continuidade criminosa. Nestes tipos os verbos contidos na descrição penal são múltiplos, de modo que ao agente poderá ser imputada responsabilidade de forma proporcional a tantas quantas forem as ações por ele intentadas. Exemplo desta situação é o do crime de Parto Suposto, descrito no Código Penal Brasileiro, no qual o agente pode praticar mais de uma ação delitiva e ser responsabilizado por cada uma delas, de forma distinta.

Pois bem, analisando o “novo” tipo penal do artigo 213 observa-se que o núcleo do tipo penal se traduz pelo verbo “constranger”, que aparece inscrito no tipo uma única vez, tendo como meios a violência ou a grave ameaça, para o fim de praticar atos libidinosos que vão desde a conjunção carnal até outros atos de libidinagem diversos. Diante disso, surge a indagação sobre se o crime de estupro é tipo misto de conteúdo alternativo ou tipo misto de conteúdo cumulativo?

Se optarmos por entender seja o tipo penal de natureza mista cumulativa, aquele que, além da conjunção carnal, pratica atos libidinosos diversos dela, incidiria em dupla conduta de estupro podendo, assim, receber dupla punição, ou uma única, mas aumentada a pena pela continuidade delitiva; ao contrário, se preferirmos compreender seja o tipo penal de natureza mista alternativa, aquele que, para além da conjunção carnal, cometer outros atos libidinosos, diversos dela, incidiria em única conduta de estupro, permitindo, portanto, única responsabilidade penal por crime de estupro, incidindo uma vez a pena.

As opiniões divergem entre os autores que já se manifestaram sobre a novel legislação. Certamente ficará a cargo dos Tribunais pátrios, diante das casuísticas, firmarem  convicção e jurisprudência sobre a responsabilidade penal do agente diante da multiplicidade de ações características para estupro.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei do artigo. Parabéns.